segunda-feira, 7 de novembro de 2011

O LENDÁRIO DRAGÃO DE FOGO DO MEU CORAÇÃO DE MENINO!!! (Agmon Carlos Rosa)


"O LENDÁRIO DRAGÃO DE FOGO DO MEU CORAÇÃO DE MENINO"!
Minha lealdade devo a um lugar, um passado, a cidade onde nasci, cresci e amei, a colonia da estação da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, aos meus pais amados,  aos mestres que me iluminaram, aos amigos leais, alicerces do meu encanto pela vida,  partes do mundo que construí.
Aos rios e lagos que me banhei,  caminhos por onde passei (o primeiro tombo de bicicleta,  filho da mãe, como chorei).  Rabeiras de caminhão peguei, em dorsos de cavalos montei,  mas,  meu coração de menino, se apaixonou pelo trem!
O trem de passageiros, da familia e forasteiros, do caixeiro viajante,  do militar, do poeta cantante, do namorado e amante.  Dos janótas grâ-finos que se reverenciavam e, o chapéu com elegância tiravam...   La Belle Époque do romantismo puro e belo, no tempo do trem das estradas de ferro!!!
Penso não ter mais tempo,   porque só sei falar do passado e vocês só pensam no futuro.... E ainda estarei falando do passado,  quando voces só querem falar de computadores,  internet, cibernética... 
Das potentes locomotivas a vapor da Henschel & Sohn,  o grande e lendário Dragão de Fogo do meu coração de menino!!!  Assim eu as conhecia...  Das suas entranhas ardentes golfavam densos rolos de fumaça,  como baforadas de um cachimbo gigante,  esfumaçando "anéis" no azul límpido dos céus!   Do silvio estridente do seu apito,  dissipando-se na monotonia das retas tediósas ou na parábola elegante das suas curvas assimétricas. 
Era fantástico ver o trem das estradas de ferro,  serpenteando pelos caminhos de aço reluzente, subindo e descendo montes,  atravessando rios,  furando montanhas,  cortando cidades inteiras.... Cidades que se vestiam de festa para ver o trem passar.  Lá estava todo mundo, com suas "roupas de ver Deus" (trajes para assistir as missas dominicais) .   Havia fogos de artificio,  faixas, bandeiras e bandas barulhentas quando se tratava de visitantes ilustres,  artistas de rádio ou cinema,  atletas famosos ou politicos,  claro!   Estes quase sempre com direito a uma comitiva de "puxa-sacos",  desfile de escolares acenando com bandeirinhas e discursos das autoridades civis, militares e eclasiásticas, cobertura da imprensa local, entrevistas ao vivo, o maior barato e delicia dos vendedores ambulantes que aumentavam seus rendimentos com um gordo faturamento extra... 
Na minha primeira viagem de trem,  a aventura real do meu coração de menino, a façanha começava com a disputa dos espaços no embarque e desembarque dos passageiros com suas bagagens.   A "batalha" para conquista de um assento ao lado da janela,  a recusa dos pais em permitir aquele privilégio (a frustação mais citada no divã dos analistas e psicólogos daqueles futuros adultos)  Valia a bronca, o choro, a manha,  um repertório inteiro de chantagens emocionais,  que em muitas ocasiões dava certo!!!    
Uma vez acomodados,  a espera do apito para a partida, a lenta e progressiva aceleração, o rápido ficar para trás das pessoas e das coisas do lado de fora do trem, o balanço ritmado da composição, a estranha equação da inércia e do movimento simultâneos...  Um rosario de emoções físicas e psicológicas.   Tudo era novidade  para o corpo, a mente e o coração daquele menino que, embora não entendendo todas as coisas, sabia que gostava daquele mundo dos adultos, tanto quanto do seu mundo de criança, sem jamais ter de renunciar a nenhum deles...
Lá fora o trem repetia um sonoro e cadenciado "só-cafezal, só-cafezal, só-cafezal", coincidindo com a paisagem interminavelmente verde dos rubiáceas.   O mundo ia ficando para trás, assim como as casas, gentes, árvores, postes, animais... também os dias,  semanas,  meses e anos, tudo passando velozmente, e também minha infancia,  doce infancia e toda aquela gente maravilhosa que um dia tanto amei...
Hoje não existe mais a emoção nas chegadas,  nem o apito no adeus das partidas... O lendário dragão de fogo do meu coração de menino,  fizera sua ultima parada na estação de nome SAUDADE!  Saudade de todos,  saudade de tudo sim,  e sobretudo,  muita saudades de mim!!!   
Trechos do conto "O Lendário Dragão de Fogo do meu Coração de Menino"   Premiado com medalha de prata no III CONCURSO NACIONAL DE LITERATURA ARTI-MANHAS  - 2008

Um comentário:

  1. Agmon, quando tive o prazer de ouví-lo no sarau da Biblioteca, lendo a história do Dragão de fogo, eu pensei comigo mesma:"Esse poeta é para ninguém botar defeito". Parabéns
    Eneida Tagliolatto

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